The Hateful Eight se passa de seis a oito anos depois do fim da Guerra Civil. A trama acompanha uma diligência qua cruza as invernais paisagens do Wyoming levando John Ruth (Kurt Russell) e sua fugitiva Daisy Domergue (Jennifer Jason Leigh) para Red Rock. No caminho eles encontram dois estranhos Major Marquis Warren (Samuel L. Jackson), um ex-soldado transformado em caçador de recompensas, e Chris Mannix (Walton Goggins), um renegado do sul que diz ser o novo xerife da cidade. Depois de se perder em uma tempestade, o grupo busca abrigo no Armazém da Minnie, uma parada de diligência nas montanhas. Lá, no lugar da proprietária, eles encontram mais estranhos: Bob (Demian Bichir), encarregado de cuidar do armazém enquanto ela visita a mãe, Oswaldo Mobray (Tim Roth), o vaqueiro Joe Gage (Michael Madsen), e o General Confederado Sanford Smithers (Bruce Dern).
182min – 2015 – EUA
Dirigido e roteirizado por Quentin Tarantino. Com: Samuel L. Jackson, Kurt Russell, Jennifer Jason Leigh, Walton Goggins, Bruce Dern, Demian Bichir, Michael Madsen, Tim Roth, James Parks, Channing Tatum, Dana Gourrier, Zoë Bell.
Os oito odiados pode facilmente enganar o espectador despreparado. Os longos e amplos planos iniciais podem insinuar que uma grande batalha/tiroteio está por vir, um final épico para uma tortuosa jornada. Não é o que acontece. Pelo contrário, os planos iniciais apesar de amplos causam uma sensação de claustrofobia. A carruagem cercada pela neve no meio do nada, ao fundo a brilhante trilha sonora de Ennio Morricone que diferente das tradicionais trilhas de faroeste remete diretamente a um clima de terror, já deixa claro o terrível rumo que o longa vai tomar.
Tarantino planeja bem o tempo de todo o filme, nas cenas inicias além de nos dar pistas do que está por vir cria tensão e ansiedade. Conhecemos os personagens com calma, temos tempo para saber como é cada um, quais suas características e objetivos. Isso é de extrema importância para o tipo de filme que vamos assistir. Quando os personagens estão todos confinados é necessário saibamos muito bem como cada um deles se sente e os possíveis conflitos que podem surgir da interação entre eles. Assim ficamos tensos mediante as possibilidades. Então, o filme segue com calma e toma o tempo necessário para nos deixar familiarizados com seus integrantes. É interessante notar que desde o início o longa coloca o caráter de seus personagens em dúvida, assim ficamos desconfiados de cada um deles. Seja pela ótima performance de seus atores ou através das rimas visuais e pistas que o diretor tanto gosta de nos entregar.
Plano detalhe de balas no chão, asas que aparecem quando determinado personagem perece, uma cruz enterrada na neve para mostrar a passagem do tempo e até mesmo que Deus está de fora do que vamos presenciar. É a forma do diretor de nos preparar, e até mesmo adiantar, o que está por vir. Um bom exemplo é quando vemos na carruagem inicial um cavalo branco e um negro lado a lado um bela dica do que veremos em um momento mais a frente no filme. Brincar com o “fazer cinema”, sempre com um propósito importante na narrativa, é uma característica constante nos filmes do Tarantino. Em um determinado momento quando o longa fica misterioso e parece um jogo de detetive, digno de romances de Arthur Conan Doyle, o diretor não exita em colocar uma narração em off (dele mesmo) e nos coloca de uma vez por todas em um jogo de adivinhação e análise. Tudo isso se confirma em uma cena bem elaborada com o personagem de Samuel Jackson.
No início acompanhamos o oficial John Ruth personagem de Kurt Russell, ele transporta a criminosa Daisy Domerge papel de Jennifer Jason Leigh para a cidade de Red Rock para ser levada a forca. Mas logo entram em contato com o Major Marquis Warren (Samuel Jackson) que de fato é o protagonista do filme. Jackson rouba a cena em diversos momentos e certamente têm os melhores diálogos do longa. Diálogos que são fortes e bem escritos. Leigh constroi uma personagem rica e dominadora, que cercada por homens e sofrendo abusos constantes, mostra sua força e consegue tomar o controle do filme de forma inteligente e insana. Walton Goggins não deixa a desejar na atuação e seu personagem o Chris Mannix, o Xerife (Será mesmo?) também ganha destaque. Esses personagens acabam confinados em um armazém/alojamento devido a pesada nevasca que os cerca. Junto com eles temos o carrasco (Tim Roth), um general aposentado (Bruce Dern), um vaqueiro (Michael Madsen), o mexicano (Demián Bichir), dentre outros. John Ruth logo fica desconfiado que um daqueles homens pretende matá-lo e libertar Daisy.
Tarantino usa do confinamento de seus personagens para colocar em pauta e discutir vários temas. Enquanto a maioria das pessoas fica esperando o inevitável banho de sangue que o encontro entre essas pessoas tão diferentes e controversas pode causar, o diretor toma seu tempo, constrói a tenção e debate sobre racismo, violência contra a mulher, preconceito contra imigrantes, guerra, questão armamentista, dentre outros. Aliás a divisão em capítulos que inicialmente pode parecer enjoativa e mais do mesmo se mostra interessante, um bom uso do processo narrativo em si e uma forma de pontuar os debates. O diretor se diverte nos fazendo assistir mais de uma vez a mesma cena e repetindo várias vezes a mesma informação (Você têm que chutar!). E em um dos capítulos vários elementos que normalmente seriam escondidos para causar mais impacto são escancarados. O planejamento das cenas é elaborado, a mise en scène é bem executa, e o cenário chama atenção por seu cuidado aos detalhes. Em um único espaço é possível perceber vários ambientes. A violência exagerada do filme não possui a intenção de chocar, na verdade é caricata e busca mais discutir a violência em si do que impressionar. Além, é claro, de ser uma marca do diretor.
Um filme com boas atuações, bons diálogos, boa direção e fotografia. Com boas cenas de ação e constituído quase completamente de diálogos. Uma ótima analogia com a história dos EUA. Um oficial, um negro, um racista, um vaqueiro, um xerife, uma criminosa, um mexicano e um britânico todos dividindo um mesmo espaço. Uma bela representação da América que ainda hoje sofre de todos os problemas que Tarantino coloca em debate.
Nota do Sunça:
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