Sunça no Cinema – Uma Cilada para Roger Rabbit (1988)

O detetive de carne e osso Eddie Valiant (Bob Hoskins) é contratado para descobrir o que está acontecendo com o coelho Roger Rabbit e sua mulher Jessica, suspeita de infidelidade. Quando Marvin Acme é encontrado morto, Roger é o principal suspeito do crime no mundo real. Para piorar a situação, um vilão quer acabar de uma vez por todas com Roger, Jessica e todos os desenhos animados.

104 min – 1988 – EUA

Dirigido por Robert Zemeckis. Roteirizado por Jefrey Price e Peter S. Seaman. (Baseado no livro de Gary K. Wolf). Com Bob Hoskins, Christopher Lloyd, Joanna Cassidy, Charles Fleischer, Stubby Kaye, Alan Tilvern, Joel Silver, Paul Springer, Betsy Brantley, Mel Blanc, Tony Anselmo.

Em 1988 o Sunça de dois anos de idade nem imaginaria que o segundo maior sucesso de bilheteria daquele ano, se tornaria um de seus filmes favoritos. A obra me impactou a ponto de direcionar minha carreira para a área de animação, quadrinhos e ilustração. “Uma Cilada para Roger Rabbit” é o trabalho mais impactante e interessante do diretor Robert Zemeckis. Isso é um grande elogio, uma vez que Zemeckis é um cineasta versátil e inovador. Responsável por filmes como “Forrest Gump: O Contador de Histórias” e a trilogia “De Volta para o Futuro”. O filme é baseado no livro “Who Censored Roger Rabbit?” escrito por Gary K. Wolf. A obra literária é menos engraçada e bem mais sombria, Gary também escreveu duas sequências: “Who P-P-P-Plugged Roger Rabbit?” e “Who Wacked Roger Rabbit”. Em uma tradução livre, os livros seriam: “Quem Censurou Roger Rabbit?”, “Quem atacou Roger Rabbit?” e “Quem Matou Roger Rabbit?”.

Imagine um universo onde humanos e desenhos animados coexistem. O ano é 1947 e estamos em um thriller com muitas reviravoltas, repleto de assassinatos e com muitas traições. É a união da era de ouro da animação com o cinema noir.  No longa o famoso coelho de desenho animado Roger Rabbit (Com a voz original de Charles Fleischer) é acusado de um assassinato que ele alega não ter cometido. Eddie Valiant (Bob Hoskins) é um detetive durão que devido a um trauma do passado não gosta das figuras animadas. Eddie aceita um caso simples de investigar uma suposta traição de Jessica Rabbit (Com a voz original de Kathleen Turner), esposa do coelho, e assim acaba no meio de toda essa confusão. Ele se torna a única esperança de Roger para limpar seu nome. Juntos eles têm que lidar com o Juiz Doom (Christopher Lloyd) que persegue o protagonista e que desenvolveu uma arma capaz de matar os desenhos. 

São personagens marcantes e cativantes, Roger Rabbit e Jessica Rabbit são facilmente reconhecidos e lembrados com carinho por quem assistiu a obra a anos atrás. Eddie Valiant é um personagem complexo em um ótimo trabalho de atuação de Bob Hoskins. A obra tornou possível a maior reunião de personagens de diferentes estúdios. Uma oportunidade única de ver Mickey interagir com Pernalonga e Pato Donald brigar com Patolino.  Steven Spielberg, o produtor do filme, foi o responsável por convencer as empresas a liberarem seus personagens para a Disney. Para isso foi necessário garantir tempo de tela iguais para famosos personagens da Warner e da própria Disney e certificar de que as personalidades de cada um fossem respeitadas. Além de pagar uma enorme quantidade de dinheiro. É uma pena não ter conseguido a liberação em tempo de alguns personagens, seria legal poder contar com o estúdio Terrytoons. A participação de Popeye, Tom e Jerry e outros personagens no filme também seria genial. 

Trinta e três anos depois, o longa ainda impressiona. A união de Zemeckis com Spielberg contou com a fundamental participação de Richard Williams, um grande animador e o diretor de animação do longa. A interação entre as filmagens live-action e as figuras animadas é inovadora, aconteceu em uma época onde efeitos especiais ainda eram extremamente “rústicos”. Com o objetivo de emular as animações clássicas, a equipe decidiu não utilizar computadores e trabalhar com a animação tradicional. São mais de oitenta e dois mil frames, e mais de mil ilusões de ótica, truques de câmera e efeitos práticos. Quando Roger bate a cabeça em uma lâmpada, ela reage ao personagem. Ao balançar a luz se move pelo ambiente e afeta o personagem animado com precisão. Um outro exemplo são as Doninhas que seguram réplicas de armas reais, um trabalho de manipulação das câmeras e efeitos práticos. Não à toa o longa teve seu orçamento estourado e uma pós-produção de quatorze meses.   

O roteiro de Jeffrey Price e Peter S. Seaman funciona para jovens e crianças, mas mira no público adulto. São personagens fofos com várias piadas visuais e físicas. Em um texto inteligente e elegante, note como uma sequência no escritório de Eddie nos revela seu passado, seus traumas e frustrações. O cuidado e a sutileza em que a sequência inicial da obra nos apresenta aquele universo. O trabalho é ligeiramente pesado trazendo por exemplo um detetive alcoólatra e um bebê de desenho animado fumante e misógino. Em camadas mais profundas o argumento sugere importantes discuções, é presente no longa uma crítica a segregação racial da época, apresentando por exemplo nas cenas do bar só para humanos “Ink ‘n’ Paint” nele os cartuns podem apenas servir e/ou participar de apresentações artísticas. Um dos vilões apresenta como plano algo que em suas palavras vai favorecer os “humanos mais abastados”. Subtextos também se fazem presentes em alguns diálogos inspirados como: “Um brinde aos engravatados, que todos morram enforcados” e “Eu não sou má, só sou desenhada assim”.  

“Uma Cilada para Roger Rabbit” é a primeira vista uma comédia noir. Ao assistir é uma experiência visual única, com personagens marcantes e carismáticos e uma trama envolvente e surpreendente. Nos bastidores é uma produção com orçamento inicial de US$29,90 milhões que custou US$70 milhões e arrecadou a segunda maior bilheteria de 1988, US$329,8 milhões. Naquele ano perdeu apenas para “Rain Man”. Um sucesso que levou sete anos para ser produzido. Uma sequência estava em um lento processo de produção, que teve seu fim com a morte de Bob Hoskins aos setenta e dois anos no ano de 2014. “Uma Cilada para Roger Rabbit” permanece assim, uma produção que tinha tudo para não ocorrer, mas que aconteceu e se tornou uma obra prima do cinema.          

Nota do Sunça:

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Sunça no Streaming – Estou Pensando em Acabar com Tudo – Netflix (2020)

Um homem leva sua namorada para viajar e, assim, conhecer seus pais. Porém, um desvio inesperado transforma a viagem do casal numa jornada terrível rumo a fragilidade psicológica e pura tensão.

134 min – 2020 – EUA

Dirigido por Charlie Kaufman. Roteirizado por Charlie Kaufman (baseado na obra de Iain Reid). Com Jesse Plemons, Jessie Buckley, Toni Collette, David Thewlis, Guy Boyd, Hadley Robinson, Gus Birney, Abby Quinn, Colby Minifie, Anthony Robert Grasso, Teddy Coluca, Jason Ralph, Oliver Platt, Frederick Wodin, Ryan Steele.

 Somos formados de várias personas e temos interesses nas mais variadas áreas. Me considero um cartunista, publicitário, quadrinista, radialista, pintor, escritor dentre várias outras atividades. Além de ser também um amálgama de diferentes pessoas. Por exemplo, já fui um guitarrista de uma banda de garagem mundialmente famosa. Também sou o Homem-Aranha e em determinado momento fui um astronauta que salvou o planeta ao som de “I Don’t Want To Miss A Thing”. E como esquecer as diversas vezes em que salvei vilarejos ao vencer duelos de bangue-bangue. Ostento com muito orgulho os diversos Oscars que recebi ensaboado no chuveiro. Na minha cabeça meio louca e mal compreendida (Por mim mesmo), já fui de tudo um pouco. Minhas memórias e criações coabitam e interagem formando quem eu sou.  

O diretor e roteirista Charlie Kaufman tem a incrível habilidade de adentrar no inconsciente humano. “Estou pensando em acabar com tudo” é um convite de Kaufman para uma jornada onde vemos a vida, o que ela foi ou o que poderia ter sido, ou até mesmo o que Jake (Jesse Plemons) gostaria que tivesse sido. É compreensível que ao rever sua vida alguém coloque em cheque suas escolhas, decisões e que misture realidade e ficção, para que seu fim seja algo mais justo em sua própria percepção. Ao rever o passado a “realidade” são suas memórias e aqui entra outro ponto chave da narrativa. Memórias são subjetivas e se misturam com nossas percepções e emoções.  Esse registro distorcido de nossa existência influencia sobre como interpretamos nosso presente e como nos enxergamos nele. Daí a discussão presente no longa sobre os humanos serem os únicos animais não capazes de viver no presente.   

Na trama a personagem creditada com jovem mulher (Jessie Buckley) viaja com o namorado Jake sob uma tempestade de neve para conhecer os pais do Rapaz, interpretados por Toni Collette e David Thewlis. Eles namoram a poucas semanas, aliás, a protagonista sequer se lembra o tempo exato. O que é um sinal de que as coisas não caminham bem. Está aí uma das leituras do título e a mais literal.  “Estou pensando em acabar com tudo” é um filme que vai dialogar com cada um de uma forma única. O longa é bem estruturado e sabe unir várias narrativas e gêneros em seus segmentos. Já no início em uma conversa claustrofóbica e opressora dentro do carro percebemos a inconsistência na jovem mulher. Sua personalidade muda a todo momento, ela demonstra falta de interesse em poesia e alguns segundos depois recita de memória um poema que acredita ser seu. Poema, que mais tarde percebemos ser da poeta Eva H.D. autora de um livro que Jake guarda em seu quarto. Sua profissão e nome também mudam constantemente, ela foi bióloga, física, garçonete e ao longo do enredo é chamada de “Lucy”, “Lúcia”, “Louise”, “Amy” e “Tonya”. 

É passeando pelo tempo e espaço que vamos conhecendo mais sobre esse casal. Saltamos do dia para a noite na velocidade de uma palavra e de um ambiente para o outro em um piscar de olhos. É um trabalho primoroso de montagem que nos deixa inquietos, interessados e incomodados. A razão de aspecto reduzida sufoca sua protagonista e compartilha conosco a angústia da jovem mulher.  É na dinâmica e no diálogo entre o casal que montamos o quebra cabeça que é a vida de Jake.  Jesse Plemons mistura carisma com estranhamento sabendo mostrar fragilidade e insegurança. Um bom trabalho de atuação que nos diz muito sobre o amadurecimento conturbado daquele personagem.  Jessie Buckley faz um ótimo trabalho com a protagonista complexa que o roteiro lhe entrega. Sabendo ser uma projeção criada e ao mesmo tempo uma pessoa independente com suas próprias vontades. Em vários momentos ela representa as angústias e incita importantes reflexões. Suas percepções acabam se unindo a nossa e assim conhecemos os pais de Jake, através das memórias dele. E vemos seus pais nas mais variadas idades e etapas da vida. Sempre com diferentes sensações e emoções, seja em momentos uma visão repulsiva e em outras carinhosa, protetora e até mesmo opressiva e raivosa.   

A jovem também nos permite conhecer Jake, já que nas constantes mudanças de comportamento e interesses faz várias referências culturais. Mudanças que podem se justificar na mistura de mulheres idealizadas pelo rapaz e até mesmo no que ele próprio gostaria de ter sido. Ela pinta as mesmas pinturas Jake e que na verdade são obras de Ralph Albert Blakelock. Ao discutirem sobre o filme “Uma Mulher Sob Influência” repete a crítica escrita por Pauline Kael. E isso é natural, constantemente recriamos elementos da cultura e sociedade que nos influenciam e cativam. Jake chega a interpretar trechos do musical Oklahoma. Em momentos de estranheza a Jovem mulher percebe que seu namorado parece saber o que ela está pensando. Sentimento que é reforçado ao chegar na fazenda que só têm ovelhas, ver o cachorro da família e perceber sua fotografia de infância no mesmo local que a de Jake. O desconforto ao longo da obra é progressivo e caminha até o momento em que a protagonista não sabe mais onde está. Seu encontro com o zelador do colégio (Guy Boyd) e o simples ato de reconhecer de quem são aqueles chinelos nos revelam a figura criadora por trás de tudo e direciona a narrativa para a leitura mórbida do título. 

“Estou pensando em acabar com tudo” nos lembra também de como é viver. De como nossas memórias e interesses ao longo de nossa jornada nos transforma em quem somos. Nossas alegrias, felicidades, dores e frustrações. O zelador reve suas decisões e opções percebendo seus erros quando é tarde demais para fazer algo a respeito. Talvez por isso, em alguns momentos,  a jovem mulher quebre a quarta parede com um olhar de desprezo. Afinal, no fim da vida o que queremos é acabar reconhecidos e premiados fazendo um belo discurso como John Nash interpretado por Russell Crowe no filme “Uma Mente Brilhante” e não enterrados na neve em uma vida, aparentemente, sem afeto.

Nota do Sunça:

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Sunça no Cinema – Debi & Lóide: Dois Idiotas em Apuros (1994)

Lloyd Christmas (Jim Carrey) e Harry Dunne (Jeff Daniels) são dois homens extremamente estúpidos. Quando Lloyd leva até o aeroporto Mary Swanson (Lauren Holly), uma bela mulher que vai para Aspen, Colorado, acredita que Mary perdeu uma mala. Na verdade ela “esqueceu” no saguão, pois dentro dela está uma grande soma para pagar o resgate do marido, mas antes que os seqüestradores peguem a valise Lloyd a recupera e tenta lhe entregar. Como o vôo já partiu e ele se sente atraído por Mary, convence Harry para irem até Aspen para devolver o dinheiro. Na viagem se envolvem em várias confusões, além de serem perseguidos pelos seqüestradores.

107 min – 1994 – EUA

Dirigido por Peter Farrelly. Roteirizado por Peter Farrelly, Bennett Yellin e Bobby Farrelly. Com Jim Carrey, Jeff Daniels, Lauren Holly, Mike Starr, Karen Duffy, Charles Rocket, Victoria Rowell.

Não existe em “Debi & Lóide” uma crítica social forte. Nem mesmo um chamado a uma reflexão sobre nossos conceitos e nossas vidas. O que temos é um convite para rir sobre as grandes bobagens da vida, que normalmente encaramos com seriedade e preocupação. O longa de estreia dos irmãos Peter e Bobby Farrelly apresenta uma trama despretensiosa com protagonistas ingênuos em uma estrutura narrativa simples. O humor, que a primeira vista pode soar estúpido, causa risadas espontâneas em uma experiência agradável.   

O filme entrou em cartaz no Brasil em 1995, eu tinha nove anos. Desde então assisti a produção diversas vezes. Eu era também uma grande fã da série animada “Os Debiloides” produzida pela Hanna-Barbera. Vinte e cinco anos se passaram desde a estreia da obra, e ao assistir novamente me peguei dando risadas em piadas que eu já sabia de cor. Dando gargalhadas espontâneas ao relembrar momentos inspirados de Jim Carrey e Jeff Daniels. Seria mais fácil e mais impressionante elogiar ou enaltecer um longa que apresente um humor inteligente ou reflexivo. Mas a verdade é que fazer rir é difícil, o que é engraçado para um é indiferente para o outro. Imagine então analisar uma comédia. Mas continuar rindo de uma produção, vinte cinco anos depois de sua estreia. Me mostra que o filme não só é bem sucedido em seu objetivo principal, mas que também existe mais do que apenas idiotices naquelas piadas e interpretações. Se você revira os olhos só de pensar nesse filme e não tem paciência para seus gracejos. Respira fundo, deixe a pretensão de lado e pega na mão do “Tio Sunça”. Eu vou te mostrar que esse besteirol, não é tão besta assim. É besta, mas é também uma das grandes comédias dos anos noventa.

Na trama, escrita por Peter Farrelly, Bennett Yellin e Bobby Farrelly, acompanhamos o ex motorista de limusine Lloyd Christmas (Jim Carrey) e ex cuidador de cães Harry Dunne (Jeff Daniels). São amigos fracassados, que moram juntos e almejam abrir uma loja para vender minhocas. Ambos perdem seus empregos e decidem atravessar o país de carro para entregar uma maleta para Mary Swanson (Lauren Holly). Mary foi a última passageira de Lloyd e esqueceu a mala no aeroporto. O que eles não sabiam é que bandidos estavam interessados naquela bagagem de mão e passam a ser perseguidos enquanto viajam em sua van canina tranquilamente pelo país.   

A dupla protagonista é carismática. Harry e Lloyd são sim estúpidos, mas é na ingenuidade e infantilidade dos personagens que está o encanto. São duas crianças em um mundo de adultos. Eles não seguem as mesma regras e não respeitam os limites impostos por nossa sociedade. A dinâmica entre os atores é ótima o que deixa a simpatia por aqueles sujeitos ainda maior. O carisma dos dois é impressionante. É legal perceber, que a sua maneira, um completa o outro. Lloyd o infantil e sonhador e Harry o mais realista e preocupado. Mas ambos longe de serem maduros, é claro. Carrey e Daniels entregam tão bem essas crianças em corpos de adultos, que piadas com um potencial para falhar funcionam. Frases como  “Quer ouvir o som mais chato do mundo?” ou “De acordo com este mapa, só andamos dez centímetros” nos fazem rir. Comportamentos como vender um periquito sem cabeça para um menino cego e lamber metal congelado nos parece algo natural. E causa gargalhadas. 

O humor do longa superficialmente é besta. Mas existe um esforço dos irmãos Farrelly em colocar piadas mais trabalhadas e de ousar nos gracejos. Boas sacadas como Lloyd comemorar a chegada do homem a lua, estão presentes em toda a trama. Na obra temos sequências politicamente incorretas, um exemplo, é quase tudo o que envolve o periquito Petey. Algumas piadas chegam a flertar com a escatologia. A sequência do policial bebendo sua “cervejinha” nos mostra isso.  E o que dizer de uma das cenas mais marcantes, e engraçadas, que envolve Harry e o laxante. É admirável a coragem dos diretores de tentar fazer com que os espectadores deixem de lado seus códigos morais e altivez, para rir dos acontecimentos banais do filme e das nossas vidas.   

São atuações impecáveis com um humor certeiro e um filme de estrada com uma ótima trilha sonora. Crash Test Dummies, Butthole Surfers, Deee-Lite e The Primitives são alguns dos nomes presentes nas canções do longa. Ouvir Pretty Woman de Roy Orbison enquanto eles se arrumam para o baile, é um deleite. Quando eles brigam e se separam temos “Mmm Mmm Mmm Mmm” do Crash Test Dummies. O que dizer de quando Lloyd é assaltado por uma senhora ao som de “Red Right Hand” de Nick Cave & The Bad Seeds. 

Jim Carrey e Jeff Daniels estão ótimos juntos, uma boa química que rende carisma e simpatia. São crianças brincando no mundo dos adultos e que nos convidam a brincar com elas. Se descermos momentaneamente de nossos pedestais e nos permitir brincar, podemos chegar a conclusão de que Lloyd só que ser aceito e que Harry se esforça para ajudar um amigo. Ou então, quem sabe, assim como a Marry, podemos nos divertir brincando na neve?

 Senso de humor varia de pessoa para pessoa, e no final o que importa para um filme do gênero é se ele te faz rir. “Debi & Loide” me faz gargalhar.

Nota do Sunça:

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Sunça no Streaming – Klaus – Netflix (2019)

Em Smeerensburg, remota ilha localizada acima do Círculo Ártico, Jesper (Jason Schwartzman) é um estudante da Academia Postal que enfrenta um sério problema: os habitantes da cidade brigam o tempo todo, sem demonstrar o menor interesse por cartas. Prestes a desistir da profissão, ele encontra apoio na professora Alva (Rashida Jones) e no misterioso carpinteiro Klaus (J.K. Simmons), que vive sozinho em sua casa repleta de brinquedos feitos a mão.

96 min – 2019 – EUA

Dirigido por Sergio Pablos. Roteirizado por Sergio Pablos, Zach Lewis, Jim Mahoney. Com J.K. Simmons, Rashida Jones, Joan Cusack, Jason Schwartzman.

Me recordo de assistir a um teaser visualmente impactante de Klaus em 2015. Na época o visual da animação, produzida pelo The SPA Studios, impressionou. O projeto tinha um nome forte na direção, Sergio Pablo. Sergio foi co-criador da série “Meu Malvado Favorito” e trabalhou como animador na Disney nos anos noventa. Participou de produções como “Tarzan” e “Planeta do Tesouro”. Após a queda das animações em 2d ele voltou para seu país de origem, a Espanha, e fundou o SPA Studios. O teaser de Klaus tinha como objetivo conseguir uma empresa para financiar o projeto. Dois anos depois, em 2017, a Netflix adquiriu os direitos da obra que reconta a origem do Papai Noel.

Em 2019 Klaus chegou a plataforma da Netflix, um filme natalino divertido e contagiante. Klaus resgata o espírito de grandes obras sobre o bom velhinho. Mas o longa vai além, Sergio criou o SPA Studios com o objetivo de inovar as animações tradicionais. Usando técnicas de iluminação e texturização para redefinir o visual do meio. Ele conseguiu.

Jesper (Jason Schwartzman) é um carteiro em treinamento, ele é filho do presidente dos correios, é mimado, preguiçoso e quer apenas curtir a “vida boa”. Vive usufruindo do bom e do melhor às custas de seu pai. Após receber um ultimato ele é realocado para a cidade de Smeeresnburg, uma ilha congelada e esquecida, localizada acima do Círculo Polar Ártico. Jesper têm que fazer o envio de seis mil cartas no prazo de um ano, assim re-conquistaria a confiança de seu pai e poderia voltar para a sua tão sonhada “vida boa”. Porém a vila vive em um eterno conflito entre os clãs Krum e Ellingboes, uma briga centenária que transformou a ilha em um local triste e hostil. Lá, Jesper conhece um misterioso carpinteiro, Klaus (J.K. Simmons) um ermitão que vive afastado em uma cabana com um galpão cheio de brinquedos. A amizade entre os dois somado ao trabalho e a ajuda de alguns aliados, como a professora Alva (Rashida Jones), transforma a cidade de Smeerensburg. Um elemento marcante do roteiro é poder acompanhar como a lenda do Papai Noel foi criada. A roupa vermelha, a risada marcante, o trenó e as renas, e a tradição das cartinhas. 

Os personagens de “Klaus” são caricatos, possuem ótimo design e características individuais. Suas animações ajudam elevar suas personalidades com pesos e movimentações próprias. Os cenários e paisagens são lindos e expressivos. São cores vivas que destacam o estilo cartum , o cuidado com a iluminação dá profundidade aos personagens e as cenas. Tudo de melhor que a animação tradicional oferece elevado com o uso de técnicas de iluminação e renderização do 3D aplicado aos desenhos. O resultado é maravilhoso. O visual, impressionante, faz parte da narrativa, é utilizado para ajudar a trama a caminhar. Um bom exemplo é  Smeerensburg. No início a cidade é depressiva, cinza e triste. Com inspirações vindas diretamente do expressionismo alemão. Ao decorrer da projeção, ela ganha tons alegres e cores mais vivas. A trilha sonora também chama a atenção, é sensível e triste, e festiva quanto necessário para a trama. Vale um destaque para a cena do “tráfico de cartas” ao som de “How You Like Me Now?”.    

Klaus ainda traz reflexões e discussões relevantes. A importância da amizade para o desenvolvimento pessoal e o impacto no ambiente ao seu redor. A importância da educação e a valorização da escola e dos professores. Quando a escola está funcionando e os alunos aprendendo percebemos o impacto em toda Smeerensburg. A educação e instrução ajuda a todos, o ódio e o extremismo perde espaço quando a leitura e o conhecimento passam a fazer parte do dia-a-dia da cidade. (Talvez a mensagem mais importante para nossos tempos.) O roteiro escrito pelo diretor e por Jim Mahoney e Zach Lewis ainda traz alfinetadas e questionamentos sobre o extremismo que vivemos. O ódio entre as famílias Krum e Ellingboe divide a todos entre duas facções. Um lado não dialoga com o outro, apenas conversam e se informam dentro de seus próprios “clãs”. E o que deixa tudo ainda mais lindo é que Sergio vai além das ações e diálogos de seus personagens, e traz todo esse debate também visualmente. São passagens poderosas e elegantes, momentos em que armas se transformam em cartas e uma espinha de peixe que vira árvore de natal, esses são alguns dentre vários outros momentos importantes da obra.     

Uma das melhores animações de 2019. “Klaus” apresenta um ótimo trabalho de produção com uma trilha sonora marcante, gags visuais e humor expressivo com personagens interessantes e cativantes. Uma história simples com foco na união e que traz reflexões e questionamentos relevantes. O Papai Noel ganha uma história de origem em um filme que já considero um clássico natalino. Uma obra que nos faz sentir crianças novamente, e que traz uma mensagem simples e necessária: “Um verdadeiro gesto altruísta pode sempre despertar outro.”

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Sunça no Cinema – Coringa (2019)

O comediante falido Arthur Fleck encontra violentos bandidos pelas ruas de Gotham City. Desconsiderado pela sociedade, Fleck começa a ficar louco e se transforma no criminoso conhecido como Coringa.

122 min – 2019 – EUA

Dirigido por Todd Phillips. Roteiro de Todd Phillips e Scott Silver. Com: Joaquin Phoenix, Robert De Niro, Zazie Beetz, Frances Conroy, Brett Cullen, Shea Whigham, Bill Camp, Glenn Fleshler, Leigh Gill, Josh Pais, Sondra James, Douglas Hodge, Dante Pereira-Olson, Hannah Gross, Brian Tyree Henry, Gary Gulman e Marc Maron.

“Coringa” nos apresenta uma Gotham City em crise no início dos anos oitenta. Estamos no meio de uma greve dos coletores de lixo, recessão econômica e uma população pobre que vive uma triste realidade repleta de dificuldades. Assim Arthur Fleck (Joaquin Phoenix) se esforça para sorrir em meio a um mundo que parece não lhe dar motivos para isso. Logo no início acompanhamos Arthur ser atacado e tomar uma surra sem motivo algum, ser maltratado por pessoas em seu cotidiano e vemos sua vida em ruínas seguindo de mal a pior. Isso nos faz sentir pena do protagonista e inicia a construção de uma empatia que aliada ao fato de acompanharmos a trama pelos olhos de Arthur, pode gerar mais adiante no espectador a aceitação do errado. Porém, ao decorrer do filme, fica claro que o ponto de vista de Fleck não é confiável, e, apesar da obra não legitimar as atitudes ruins do Coringa, podemos sim ter essa sensação. E isso é perigoso. As ações do Coringa são erradas, egoístas e injustificáveis. Não há como defender a violência. 

Arthur Fleck trabalha como palhaço para uma agência decadente. É um homem de meia idade que vive e cuida de sua mãe, e em seu tempo livre busca uma carreira como comediante.  Após ser demitido e ver seus esforços para manter seu equilíbrio psicológico serem em vão. Suas sessões com uma assistente social e seus medicamentos sofrem cortes de verba pública e são terminados pelos políticos locais. Fleck culpa os ricos e poderosos por sua situação, personificados na figura de Thomas Wayne (Brett Cullen), e começa a ficar louco até se transformar no personagem título. 

A direção certeira de Todd Phillips sempre em equilíbrio com o roteiro, escrito pelo diretor e por Scott Silver, criam um elaborado estudo de personagem, com arcos dramáticos bem estabelecidos e construídos. A montagem e fotografia de “Coringa” ambientam uma Gotham suja e decadente. A obra segue um ritmo contemplativo, gera uma imersão e um suspense contínuo. É um belo trabalho estético que fortalece a ideia da luta de classes, pobres que vivem literalmente na sarjeta, compartilhando as ruas com super-ratos e os ricos que ocupam a política, os grandes edifícios e a mídia. Manipulando a verdade a seu gosto e tirando proveito de suas posições privilegiadas enquanto ignoram o resto da sociedade. Em meio a isso temos Arthur, um homem instável à margem da sociedade. Fleck usa roupas sóbrias, está sempre cercado de tons pastéis e retratado em ambientes escuros e opressores. O que é importante para valorizar sua mudança ao se tornar o famoso vilão. Que usa tons quentes e mais chamativos. Phillips escolhe retratar Fleck sempre atrás de grades, portões e barras. Seus cenários empilhados e azulados são prisões que contrastam com o branco iluminado na cena final do longa. A escadaria que Fleck sempre sobe com dificuldade, peso e com suas roupas pastéis, representa bem a dificuldade com que ele segue sua vida. Não é atoa que também é palco de uma dança libertária enquanto a desce, com suas novas vestimentas com cores vivas e chamativas. 

Joaquin Phoenix é um ator brilhante, presente em quase todas as cenas do filme, ele traz uma fisicalidade incrível para o personagem. Um trabalho de voz, corpo e expressão que impressiona. Fleck está sempre de ombros arqueados têm um andar penoso e pesado e sua figura tem uma magreza crua que mostra que algo está errado com aquele corpo. Na medida em que acompanhamos a transformação do personagem, sua postura muda ganhando ares de auto-confiança. Sua gestualidade passa a ter posturas poderosas até chegarmos ao momento final, onde um contra plongée exibe o poderoso Coringa. Assim como Arthur, sua risada também não se encaixa. O protagonista sofre de um distúrbio psicológico que o faz rir em momento inoportunos. Uma risada doída e incontrolável. Outras variações também se fazem presentes, risadas naturais, artificiais, sociais e sempre reforçando o estado de espírito do personagem e ajudando na construção do seu “eu”. Fleck se entende e se constrói à nossa frente. Aos poucos vemos o personagem se soltar das “amarras” da sociedade, e de sua vida, e abraçar sua visão de mundo louca, perturbada e má.

Existem motivos pelos quais esse Coringa psicopata mata. Podemos sim entender suas escolhas e ações. O que não se pode é justificar. Arthur é louco e suas atitudes narcisistas, ele não representa uma anarquia ou um movimento contra os poderosos, o que ele quer é alimentar seu ego. Quer se sentir importante e ser notado pela sociedade. Enaltecer essa atitude e tentar justificar seu comportamento psicopata é perigoso. Mas discutir e tentar entender de onde surgem esses comportamentos é importante. Afinal é fácil apontar o dedo e culpar isso ou aquilo como motivação, difícil é reconhecer que somos todos culpados por não conseguir estabelecer uma sociedade mais justa e harmônica.           


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Sunça no Cinema – Turma da Mônica: Laços (2019)

Floquinho, o cachorro do Cebolinha (Kevin Vechiatto), desapareceu. O menino desenvolve então um plano infalível para resgatar o cãozinho, mas para isso vai precisar da ajuda de seus fiéis amigos Mônica (Giulia Benite), Magali (Laura Rauseo) e Cascão (Gabriel Moreira). Juntos, eles irão enfrentar grandes desafios e viver grandes aventuras para levar o cão de volta para casa.

96min – 2019 – Brasil

Dirigido por Daniel Resende, roteirizado por Thiago Dottori. Com: Giulia Benite, Kevin Vechiatto, Laura Rauseo, Gabriel Moreira, Mônica Lozzi, Paulo Vilhena, Ravel Cabral e Rodrigo Santoro.

A maioria das crianças brasileiras da minha geração, aprendeu a ler com os gibis da turma da mônica. Comigo não foi diferente. Aliás, é um dos motivos pelo qual hoje sou quadrinista e cartunista. Ouso dizer, que até hoje a turminha é extremamente popular com as crianças e jovens em geral. A ideia de ver a criação de Maurício de Souza na telona, inicialmente, desagradou muitos fãs. Mas não a mim. A escolha de adaptar a Graphic MSP “Turma da Mônica – Laços” dos amigos Vitor e Lu Cafaggi, para mim era acertadíssima. A HQ de 2013 foi um grande sucesso de crítica. E trazia um conto de Mônica, Cebolinha, Cascão e Magali no melhor estilo “Goonies” e “Conta comigo”. Uma história de crescimento e amadurecimento que fortalecia os laços da turma. Outra escolha que me deixava confiante era o diretor. Daniel Rezende que após anos de carreira como um ótimo montador em longas diversos como: Cidade de Deus, Água Negra, Diários de Motocicleta, Tropa de Elite 1 e 2 e Ensaio Sobre a Cegueira. Só para citar alguns. Estreou na direção com o ótimo “Bingo – O Rei das Manhãs”. Fico muito feliz de “Turma da Mônica: Laços” ter atendido as minhas expectativas. E não tenho palavras para dizer como foi especial poder assistir ao filme na mesma sessão que o Vitor, Lu e o Maurício de Souza.  

Floquinho, o “cacholinho” do Cebolinha (Kevin Vechiatto), é sequestrado. Então Cebolinha, Mônica (Giulia Benite), Magali (Laura Rauseo) e Cascão (Gabriel Moreira) partem juntos em busca do cãozinho. Para isso, a turminha enfrenta grandes desafios e vive uma aventura recheada de planos infalíveis e amigos fiéis. O roteiro de Thiago Dottori segue a base da HQ do Vitor e da Lu, mas traz consigo novos personagens, situações e acontecimentos.  O universo criado no filme remete sim a Graphic MSP, mas se parece mais com os gibis clássicos dos personagens. A direção de arte é linda, um visual colorido que cria uma ambientação analógica e atemporal, assim como nas hqs. Temos vendedores de rua, muitas praças, árvores e parques. Vale uma menção para a participação de Leandro Ramos como vendedor de balões. Participações e easter eggs são o que não faltam. Temos a presença de Maurício de Souza e do Vitor e Lu Cafaggi. Menções a Turma do Penadinho, as aparições de Cranicola e do Louco (Rodrigo Santoro). A sequência do encontro entre o Louco e o Cebolinha é inventiva, usa de truques de montagem e representa bem o personagem. Além de trazer um “resumo” do aprendizado do Cebola. Temos também vários bonecos e objetos que são menções e representações de outros personagens. Um outro elemento essencial da obra é a trilha sonora, que além de pontuar cenas específicas, acentuando momentos importantes, cria uma atmosfera única para toda a projeção. É impressionante como a trilha sonora de Fabio Góes é respeitosa e inovadora. E como ajuda a narrar a história.

Certamente outro ponto forte é o elenco. Giulia Benite (Mônica), Kevin Vechiatto (Cebolinha), Laura Rauseo (Magali) e Gabriel Moreira (Cascão) ficaram perfeitos nos papéis. São talentos mirins promissores. Todos eles se destacam individualmente e coletivamente. A caracterização deles e dos demais personagens também está impecável. O tom escolhido para o filme não é tão lúdico como nos gibis iniciais, é mais emotivo, nostálgico e dramático. Porém sem perder o viés divertido e cômico, afinal, o público alvo da obra é o infantil. No início a Mônica é coadjuvante de seu próprio filme. Cebolinha é desrespeitoso e irritante com seus amigos. E o que parece ser um comportamento tóxico na tela, é na verdade posto em discussão. Destaco aqui a surpreendente, e emotiva, cena com a Mônicas e seus olhos cheios de lágrimas após uma discussão da turma na floresta. É um grande aprendizado para o próprio Cebolinha e seu arco dramático mostra a importância de valorizar seus amigos, e suas diferenças. O que rende a ótima sequência de resgate do Floquinho. Todos eles têm que fazer “sacrifícios” e confiar uns nos outros para garantir o sucesso da missão. A importância da amizade e seus “laços” é nítida e representada de forma literal na floresta. 

“Turma da Mônica: Laços” cumpre a sua difícil missão. Representa bem os personagens de Maurício de Souza, traz a tela a ótima história de Vitor e Lu Cafaggi e apresenta uma produção nacional que transborda carisma, qualidade técnica e comprometimento com os fãs. A direção de Daniel Rezende é cuidadosa, carinhosa e talentosa. Seus enquadramentos ajudam a contar a história. Em vários momentos refletem as angústias, alegrias, tristezas e teimosias (No caso do Cebolinha) de seus personagens.  No fim, vemos que os “planos” nem sempre são “infalíveis”. Mas os “laços” da amizade são.

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Sunça no Cinema – Homem-Aranha no Aranhaverso (2018)

Miles Morales é um jovem negro do Brooklyn que se tornou o Homem-Aranha inspirado no legado de Peter Parker, já falecido. Entretanto, ao visitar o túmulo de seu ídolo em uma noite chuvosa, ele é surpreendido com a presença do próprio Peter, vestindo o traje do herói aracnídeo sob um sobretudo. A surpresa fica ainda maior quando Miles descobre que ele veio de uma dimensão paralela, assim como outras versões do Homem-Aranha.

117 min – 2018 – EUA


Dirigidor por Bob Persichetti, Peter Ramsey e Rodney Rothman. Roteirizado por Phil Lord, Christopher Miller. Com Shameik Moore, Hailee Steinfeld, Mahershala Ali, Jake Johnson, Liev Schreiber, Nicolas Cage, John Mulaney, Lily Tomlin.

“Qualquer um pode usar a máscara!”

Essa é a fala de Miles Morales que vai te fazer chorar. Pelo menos para mim, esse foi um dos vários momentos em que chorei ao assistir o melhor filme do aranha: Homem-Aranha no Aranhaverso. Muitos dirão que eu sou clubista ao falar sobre o Homem-Aranha, e talvez eu seja mesmo. Mas isso não desmerece o fato de estarmos diante de uma das melhores adaptações de quadrinhos dos últimos tempos. Visualmente linda e com um roteiro forte a obra acerta em cheio no cerne do personagem. É engraçada, é triste, é aventuresca e emocionante.

O que difere o aranha dos demais super-heróis são seus problemas do cotidiano, alguém imperfeito recebe o “chamado ao heroísmo” e devido ao seu senso de responsabilidade e força de vontade tenta fazer o melhor com o que têm em mãos. É aí que nos identificamos. Somos e queremos ser ele. E, é nesse espírito de amor ao personagem que o longa é certeiro e nos mostra que qualquer um pode ser o Homem-Aranha. Algo já dito pelo próprio mestre Stan Lee, quando disse que o fato de o herói estar todo coberto nos permite imaginar que estamos por de trás da máscara. Não importando o gênero e a etnia. Todos podemos estar no uniforme. (A participação de Stan é outro momento em que chorei no filme)

O Rei do Crime (Liev Schreiber) abre uma fenda interdimensional no meio de Nova Iorque. Várias dimensões se alinham e Homens-Aranhas de diferentes realidades acabam juntos no mundo em que Miles Morales (Shameik Moore) foi picado pela aranha radioativa. Nessa dimensão Peter Parker (Jake Johnson) é um herói consagrado, mas acaba morrendo. E em meio a tudo isso Miles tenta lidar com seus poderes, seus problemas pessoais na escola e o relacionamento com o pai. E a responsabilidade de deter o Rei do Crime cai em suas mãos. Para impedi-lo recebe a “ajuda” de outras versões do Homem-Aranha.  O filme adapta a história de origem de Miles Morales do Universo Ultimate da Marvel e a mescla com a recente saga Aranhaverso. A narrativa é muito bem roteirizada e rapidamente somos imersos naquela história.

Um garoto que ainda está se descobrindo como pessoa, e agora como Aranha é a porta de entrada dessa nova adaptação. Morales têm várias peculiaridades diante das demais versões do herói, o que o torna único. Um ponto forte é seu relacionamento com o Peter Parker (Johnson) que acaba sendo seu mentor, em sua própria dimensão Parker é um herói vivido, porém em decadência. Que encara seus próprios dilemas. É o mestre em decaída e o aprendiz desorientado. A voz original desse filme é outra de suas qualidades, por isso, fica a recomendação de assistir no idioma original. Hailee Steinfeld apresenta uma Gwen Stacy forte, sua personagem têm uma ligação imediata com Morales e posso garantir que a Mulher-Aranha vai ser a favorita de muitos espectadores. O Spider-Ham de John Mulaney e suas ações e animações estilo Looney Tunes merece aplausos e rende muitas risadas. A Peni Parker, personagem de Kimiko Glenn e seu estilo anime não deixa a desejar. O Homem-Aranha Noir com a voz de Nicolas Cage é impagável. Melhor filme de herói de Cage. Vale um destaque também para a Tia May (Lily Tomlin) que está longe de ser uma velhinha indefesa.

O que torna Homem-Aranha no Aranhaverso uma ótima animação, além de um ótimo filme de super-herói e um ótimo longa do Aracnídeo, é seu visual. A obra é linda, dinâmica e ágil. Além dos diferentes designs das versões do Aranha, a forma como os personagens são animados é diferente. Com exceção de Peter e Morales que seguem o mesmo padrão. Fica fácil perceber por exemplo o estilo Tex Avery do Spider-Ham. E o mais interessante é que nada é gratuito e tudo auxilia a trama, ajuda a história a se mover adiante e caracterizar as diferentes dimensões. São cores espetaculares que remetem aos quadrinhos, o uso de balões de pensamento junto com os cortes e enquadramentos deixam tudo dinâmico. A trilha sonora é certeira e uma peça chave em toda condução do longa. É uma experiência de quadrinhos no cinema, são páginas animadas que vão além e trazem o melhor dos dois mundos. O que permite uma batalha genial no clímax do filme.

Homem-Aranha no Aranhaverso faz referência a todos os filmes que o herói já estrelou e, é claro, traz os famosos easter eggs tão divertidos de procurar e encontrar. Uma obra que acerta em todos os quesitos, ainda que seu roteiro conte com algumas coincidências. Os diretores Peter Ramsey, Bob Persichetti e Rodney Rothman fazem um ótimo trabalho e trazem um novo patamar para o gênero super-herói. Os roteiristas Phil Lord e Christopher Miller estão de parabéns por evocar durante vários momentos um sentimento heroico apenas sentido antes na cena do metrô de Homem-Aranha 2 de Sam Raimi.  E vale repetir, pois o maior acerto de Aranhaverso é o soco no coração do espectador em especial do fã de longa data do herói.

“Qualquer um pode usar a máscara!”

Obs. Fique durante os créditos, eles são ótimos. A cena pós-créditos também.

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Sunça no Cinema – Missão: Impossível – Efeito Fallout (2018)

Obrigado a unir forças com o agente especial da CIA August Walker (Henry Cavill) para mais uma missão impossível, Ethan Hunt (Tom Cruise) se vê novamente cara a cara com Solomon Lane (Sean Harris) e preso numa teia que envolve velhos conhecidos movidos por interesses misteriosos e contatos de moral duvidosa. Atormentado por decisões do passado que retornam para assombrá-lo, Hunt precisa se resolver com seus sentimentos e impedir que uma catastrófica explosão ocorra, no que conta com a ajuda dos amigos de IMF.

167 min – 2018 – EUA

Dirigido por Christopher McQuarrie, roteirizado por Christopher McQuarrie. Com: Tom Cruise, Henry Cavill, Rebecca Ferguson, Simon Pegg, Ving Rhames, Sean Harris, Michelle Monaghan, Vanessa Kirby, Alec Baldwin e Angela Bassett.

Sou fã da série “Missão: Impossível”. Desde o primeiro longa de 1996, dirigido por Brian De Palma, Ethan Hunt e suas acrobacias para evitar o “impossível” me cativou. E agora, vinte e dois anos depois emplacando sua sexta aventura a franquia demonstra estar mais fresca do que nunca. É o episódio mais longo, duas horas e quarenta e sete minutos que passam voando, o primeiro a repetir um mesmo diretor, Christopher McQuarrie que também dirigiu o ótimo filme anterior “Missão: Impossível – Nação Secreta”. O diretor retorna e apresenta o melhor longa de toda a franquia. “Missão: Impossível – Efeito Fallout” é ágil, inteligente e habilidoso, aprofunda seus personagens e constrói sequências de ação brilhantes.

É uma pena que o gênero “filme de ação” seja menosprezado e/ou considerado por muitos “menor”. Neste longa temos um bom exemplo de que quando bem executado podemos presenciar algo genial. Nesta nova missão mercenários intitulados como Apóstolos têm um plano que envolve o Sindicato, apresentado no longa anterior, e uma carga de plutônio. Então o IMF têm que intervir para evitar uma destruição em massa e o caos. Basicamente Ethan Hunt (Tom Cruise) e sua equipe têm que evitar uma ameaça nuclear ao mesmo tempo em que impedem Solomon Lane (Sean Harris), vilão também apresentado no filme anterior, de fugir da prisão. E, é claro, tudo isso em meio a muitas reviravoltas e surpresas.

McQuarrie, que também assina o roteiro, comanda de forma exemplar as cenas de ação, são perseguições de carro, de moto, a pé e até de helicóptero. A misancene é bem planejada. Entendemos bem tudo o que acontece e não ficamos perdidos no espaço em que a ação ocorre. Nas cenas de luta é possível perceber o porquê da escolha de cada movimento dos personagens. Em seu roteiro, o diretor consegue resgatar elementos clássicos de toda a franquia, sempre de uma forma atual e dinâmica. A fotografia faz bem o seu trabalho e vêm acompanhada da trilha de Lorne Balfe que exalta a tensão e deixa ainda mais frenética a ação do filme.

Tom Cruise impressiona. Aos cinquenta e seis anos de idade ele parece não ter limites. Se nos episódios anteriores da franquia ele já escalou o prédio mais alto do mundo e se pendurou em um avião que decola e voa. Agora ele corre como louco saltando de prédios (Inclusive chegou a quebrar o tornozelo em uma dessas cenas), faz acrobacias pilotando carros e motos, aprendeu a pilotar helicóptero para protagonizar uma das melhores cenas do filme. A qual, inclusive, se inicia com o protagonista dependurado para o lado de fora. E o diretor Christopher McQuarrie sabe valorizar esse esforço. Os demais membros do elenco também estão bem, Ilsa Faust retorna com sua personagem Rebecca Ferguson é protagonista de várias sequências. Ela está longe de ser uma donzela em perigo é forte e toma suas próprias decisões. Benji Dunn de Simon Pegg retorna e além de alívio cômico consegue mostrar sua veia para ação. Henry Cavill cria um Walker imponente e poderoso.  Ving Rhames e Michelle Monaghan também estão de volta e muito bem em suas participações. A entrega do elenco é importante porque de fato acreditamos que eles são capazes de executar as proezas que presenciamos ao longo de toda a trama.

“Missão: Impossível – Efeito Fallout” é dinâmico, ágil e eficaz. Sabe surpreender, inovar ao mesmo tempo que faz homenagens os episódios anteriores. É um filmaço.

Obs. Assisti ao filme em uma sessão de IMAX 3D. O 3D não é imprescindível, mas recomendo fortemente que assistam ao longa na maior tela possível.  O IMAX vale a pena.

Nota do Sunça:

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Sunça no Cinema – Um Lugar Silencioso (2018)

Em uma fazenda dos Estados Unidos, uma família do meio-oeste é perseguida por uma entidade fantasmagórica assustadora. Para se protegerem, eles devem permanecer em silêncio absoluto, a qualquer custo, pois o perigo é ativado pela percepção do som.

90min – 2018 – EUA

Dirigido por John Krasinski e roteirizado por Bryan Woods, Scott Beck e John Krasinski. Com John Krasinski, Emily Blunt, Millicent Simmonds e Noah Jupe.

Dia 89. É assim que somos “jogados” na trama de “Um Lugar Silencioso”. Iniciamos nossa jornada no meio da história (um uso clássico da técnica “In medias res”), na trama, o apocalipse já aconteceu. Um grupo de sobreviventes em uma pequena cidade abandonada, entra em um supermercado também abandonado. Rapidamente percebemos a gravidade da situação e a importância do silêncio, fica clara a ligação do som com a iminente ameaça. Dessa forma o diretor John Krasinski, que também atua no longa, utiliza a sequência inicial para nos situar na narrativa, demonstrar suas dinâmicas e a força da ameaça. É impressionante como algo comum, uma criança segurando um brinquedo, se torna algo assustador e ameaçador.

Logo “pulamos” para o dia 472, e Lee Abbott (John Krasinski) vive em uma fazenda com sua família.  Ele ensina seus filhos, Regan (Millicent Simmonds) e Marcus (Noah Jupe) a sobreviver em um mundo onde a ausência de som significa vida. Sua esposa Evelyn (Emily Blunt) está grávida. Todos eles tentam viver e superar traumas do passado enquanto se protegem de criaturas atraídas pelo som. É impressionante como o design de som, a fotografia e a trilha sonora criam a todo momento sensações fortes. Angústia, medo e desespero são constantes, o clima é assustador e a tensão e suspense paira a todo momento. Tudo isso sem utilizar diálogos, já que, não estão presentes em mais da metade da obra. A direção de Krasinski utiliza muito bem o silêncio. Ele  é construído, é uma ambientação. O diretor é competente com seus posicionamentos de quadro sabendo causar tensão. Planos detalhes nos mostram objetos que a qualquer momento podem piorar a situação. E elementos simples como o som de passos, respiração e ruídos de objetos se tornam aterrorizantes em contraponto ao alto ruído de uma cachoeira que é tranquilizador.

O roteiro de Bryan Woods, Scott Beck e John Krasinski transforma o silêncio na peça chave do filme. Um pequeno deslize pode destruir todo o esforço de sobrevivência de nossos protagonistas. E são nos momentos de silêncio em que o elenco brilha. É nítida a química entre Emily Blunt, em uma de suas melhores performances, e John Krasinski marido de Blunt na vida real e no longa. Sentimos o seu sofrimento o carinho que um tem pelo outro e por seus filhos. Noah Jupe também está bem e Millicent Simmonds, em uma ótima atuação, interpreta a filha do casal. Sua personagem tem uma deficiência auditiva (Na vida real a atriz também têm deficiência auditiva) e a trama aproveita bem isso. É formidável como a personagem, por não escutar o ambiente ao seu redor, não se assusta em determinados momentos e em outros se torna um perigo exatamente pelo mesmo motivo. John Krasinski utiliza isso em momentos chaves, nos quais acompanhamos acontecimentos pela perspectiva da personagem. Em um filme de terror/suspense personagens humanos e reais são fundamentais. Como nos identificamos com eles e gostamos deles passamos a temer por suas vidas.

“Um Lugar Silencioso” é corajoso. É um filme de gênero que sabe muito bem reger seus espectadores. Temos os momentos de susto (Jump scare), a tensão e suspense constante e nos aterrorizamos e preocupamos com seus personagens. Uma trama interessante baseada no silêncio, ótimas atuações e uma direção primorosa.    

Nota do Sunça:

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Sunça no Cinema – Star Wars: Os Últimos Jedi (2017)

Após encontrar o mítico e recluso Luke Skywalker (Mark Hammil) em uma ilha isolada, a jovem Rey (Daisy Ridley) busca entender o balanço da Força a partir dos ensinamentos do mestre jedi. Paralelamente, o Primeiro Império de Kylo Ren (Adam Driver) se reorganiza para enfrentar a Aliança Rebelde.

152 min – 2017 – EUA

Dirigido e roteirizado por Rian Johnson. Com Mark Hamill, Daisy Ridley, John Boyega, Oscar Isaac, Laura Dern, Domhnall Gleason, Andy Serkis, Adam Driver, Carrie Fisher e Kelly Marie Tran.

Em Star Wars o ponto central sempre foi o embate luz e o lado negro da força. O bom versus o mal. Eis que o diretor Rian Johnson, e também roteirista, de “Star Wars: Os Últimos Jedi” nos apresenta uma obra focada em uma nova área, a cinza. Agora, no oitavo longa da franquia, fica claro que os tradicionais lados do embate não são tão opostos assim. Eles andam lado a lado, convivem no mesmo espaço e se confundem. Personagens como DJ (Benício Del Toro) e/ou uma passagem por cidade cassino pode parecer desnecessário ou subutilizado. Mas, na verdade, têm o objetivo de deixar ainda mais claro como os conceitos são misturados. A mescla da premissa tradicional do bem contra o mal permeia todo o longa e seus personagens.

A trama da sequência aos acontecimentos de “Star Wars: O despertar da força” e se divide em três linhas dramáticas. A Primeira Ordem, em posição de superioridade, persegue os rebeldes remanescentes. A Aliança Rebelde, liderada pela general Organa (Carrie Fisher), está enfraquecida perante os exércitos do líder supremo Snoke, liderados pelo general Hux (Domhnall Gleeson) e o aprendiz Kylo Ren (Adam Driver). O atormentado Ren continua sua luta para se provar um bom aprendiz do lado negro da força. Já Rey (Daisy Ridley), tenta convencer o exilado Luke Skywalker (Mark Hamill) a se unir a causa rebelde. Luke não se mostra interessado em lutar e nem em treinar a jovem. Enquanto isso Finn (John Boyega), Poe Dameron (Oscar Isaac) e a novata Rose (Kelly Marie Tran) precisam impedir que as naves da Primeira Ordem persigam as embarcações rebeldes.

O filme nos mostra uma faceta mais humana de seu personagens, é interessante como cria uma ligação e um paralelo entre Rey e Kylo Ren. Luke demonstra fraquezas e dúvidas está longe de ser a grandiosa lenda antes apresentada. São corajosas as decisões do diretor, elas renovam a saga e mudam estruturas tradicionais dos longas anteriores. “Os Últimos Jedi” provoca questionamentos e transforma seus personagens. (É comum a sensação de que os protagonistas não sabem qual caminho percorrer.) É equilibrado, traz mais humor que os longas passados combinados com momentos bem mais intensos do que alguns vistos em “Star Wars: O império contra-ataca”. E no fim, consegue ser inspirador. Uma questão importante que permeia todo o filme é o embate entre passado e presente. Se em “O Despertar da força” somos apresentados aos novos personagens e reencontramos os antigos, agora os novatos assumem a liderança.

Rey, cada vez menos inocente, continua carismática e protagoniza cenas memoráveis com o melhor Luke Skywalker visto no cinema. Hamill é engraçado, emociona e consegue demonstrar a imperfeição de seu personagem. Adam Driver mostra o conflito e a força de Kylo Ren enquanto percebemos sua fúria crescer gradativamente. Carrie Fisher recebe uma linda homenagem, e a general Organa é inspiradora e poderosa. Poe Dameron recebe mais destaque e Oscar Isaac consegue transformar o piloto em um personagem multifacetado. Poe é de fato o melhor piloto da aliança e protagoniza as batalhas espaciais mais dramáticas e emocionantes da saga. Isso devido ao ótimo trabalho de edição de som, mixagem e efeitos espaciais. Fin e Rose rendem bons alívios cômicos e seus arcos ilustram bem como a galáxia é cinza e nos mostra que nem todos seus seres estão engajados na guerra. Homenagens são feitas e o sentimento de nostalgia evocado, mas sempre de forma fluida no roteiro e ajudando a trama a caminhar adiante. Vale um destaque para a trilha de John Williams que sabe muito bem mesclar temas novos e antigos ao longo da obra.

É fácil afirmar que “Star Wars: Os Últimos Jedi” é o longa com o visual mais bonito da série. A batalha final prova isso. É também um filme que acredita em seus personagens, explora suas facetas e os deixa mais “humanos”. E essa dualidade é perceptível, é palpável. O diretor toma decisões corajosas, empurra a franquia para frente e inova. Uma boa aposta no verdadeiro equilíbrio da força.

Nota do Sunça:

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